terça-feira, 3 de julho de 2012

O tropicalismo musical é a semana de 22 na música popular

Pesquisando e notando que existe um documentário sobre tropicália prestes a ser lançado, faço uma notinha para opinar sobre o assunto.

O que jornalistas como Torquato Neto e Nelson Motta chamaram de tropicalismo a partir da instalação de Hélio Oitica, de Terra em Transe de Glauber e da canção Tropicália de Caetano foi, no campo musical, expressão da semana de 22 no campo da música popular.

Se a Semana de 22 afirmou o direito de pesquisa estética, a atualização da intelectualidade e a estabilização de uma consciência criadora nacional, o tropicalismo musical só realmente diverge nesse último item. Nesse quesito, além de atualizar a música popular com as conquistas de 22, ele se decidiu a violentar e desestabilizar a consciência criadora nacional, afirmando o "som universal". Nesse sentido, ao mesmo tempo em que atualizou a música popular com 22, o tropicalismo musical rompeu com um dos princípios e se projetou para a pós-modernidade.

Lembremos que na Semana de 22 não houve música popular, apenas erudita, com Villa-Lobos. A atualização veio, em parte, nos anos 60, inspirada no movimento de atualização do cinema liderado por Glauber Rocha, pois já havia acontecido com Noel Rosa, Orestes Barbosa, dentre outros, além do próprio movimento de bossa nova nos anos 50. Os ingredientes da tropicália já existiam nos anos 50  e início dos 60: o Cinema Novo com Rio Quarenta Graus (Nelson Pereira dos Santos), a bossa nova com João Gilberto e a bossa engajada de Sérgio Ricardo, o neoconcretismo de Ferreira Gullar e Oiticica, a poesia concreta de Haroldo de Campos (já inspirada por Oswald de Andrade). Na literatura, o poema Sujo do Gullar, o Pessach a Travessia do Cony e o Quarup de Antonio Callado aconteceram ao mesmo tempo do movimento, mostrando que a literatura estava totalmente de acordo com os princípios citados acima: pesquisa estética, consciência criadora nacional, atualização da intelectualidade.

Ao misturar bossa nova, rock and roll e poesia concreta, traduzindo a mistura com sons e letras que misturavam marchinha de carnaval com guitarra e orquestra erudita, músicas latinas sobre Che com brincadeiras citando Nouvelle Vague e Cinema Novo, o tropicalismo musical causou sensação por sintetizar muito do que vinha toda uma década antes, apresentando tudo como a última novidade! Virou, então, referência até hoje não ultrapassada, pois muitos supõem em sua absoluta originalidade.

Tudo isso estava no ar, mas o tropicalismo musical colocou marchinhas com guitarra elétrica e roquinhos anarquistas em festivais que deveriam ser para proteger a MPB e o público universitário do avanço do rock nos meios de comunicação de massa, daí a reação negativa dos estudantes.

A polêmica que se seguiu turbinou a carreira de Caetano e Gi, que viraram ícones de geração. Uma década depois, a indústria cultural passou a pressionar pela superação da estética original do Cinema Novo em prol da estética subroliudiana da Globo, obtendo adesões como a do cinemanovista Cacá Diegues, que ainda em 1979 proclamou "um cinema popular, sem ideologias". No transe que se seguiu, morreu Glauber Rocha, poucos anos depois a Embrafilme.

Cacá Diegues direcionou a pressão contra o modelo estatal e a estética nacional para um ataque genérico ao PCB e à esquerda. Falava em dissidentes na URSS presos em hospícios, mas os dissidentes eram gente como Zhores Medvedev, que escreveu um texto provando que Stálin era continuador de Lênin, o que arrebentava com os fundamentos do namoro eurocomunismo/URSS. Até hoje, Medvedev poderia ser considerado louco, por defender essa tese, pela intelectualidade do mundo ocidental.

O assunto tropicalismo rende rios de tinta na academia. O melhor analista, a meu ver, é o Marcelo Ridenti, da UNICAMP, que observa que o tropicalismo musical é fruto do mesmo contexto do teatro engajado, do cinema novo, mas é diferenciado. Também acho. Ele se lança muito mais como afirmação de uma indústria cultural então nascente, acabando com os festivais como resistência para a música nacional e popular. E o que a indústria cultural queria era uma música mais afinada com o que era produzido na matrix, tal como Beatles e Jimi Hendrix.

Por isso Caetano e Gil foram esse sucesso, cada vez maior, de mídia. É o prêmio da indústria cultural.




Um comentário:

Anônimo disse...

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