quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Cleópatra, de Júlio Bressane, Bresson, Besson

Eu também acabo de ver Cléopatra. Reli a opinião do Marcelo Coelho e postei-a abaixo. O título é uma brincadeira: não consigo comparar Bressane com os cinestas franceses acima citados, o Robert Bresson que é o autor de Pickpocket nem com o Luc Besson de Imensidão Azul e O Quinto Elemento.

Eu vi o filme duas vezes e o que destaco é o contrário do Marcelo: a beleza da cenografia, as belas soluções encontradas para recriar, com baixo orçamento, a faustosa corte de Cléopatra. Com recursos de luz e sombra, gravações à beira-mar, composição de cores em jardins, foi possível dar o clima desejado. Os diálogos são altamente elaborados, me dá vontade de anotá-los. Reverencio Bressane. Penso que deve ser o melhor cineasta brasileiro em atividade, juntamente com Paulo César Sarraceni. Cacá Diegues mudou muito sua estética, mas sua trajetória tem filmes louváveis e que serão redescobertos, como ele mesmo profetizou.

Não vi esse espírito de paródia, não; a idéia é a fruição, mostrar soluções criativas de um grande artista. Há ironia quando Cléopatra desnuda César e fala: "jamais alguay foi tratado pelos deuses com tanta singularidade". Eu vi o filme em DVD e repeti essa cena, a pedido de minha esposa. É alguay mesmo! É uma piada com Miguel Fallabela, que nessa cena tem dois dedos enfiados no ânus por parte de Cléopatra, que antes tira os anéis, claro. Curioso Coelho não comentar isso. A proposta de Bressane é, enfim, fazer filmes para uns poucos que podem fruí-los devidamente, como bem cantou a bola Ivan Lessa. É belo, mas é para paladares sofisticados. A narrativa é lenta, contemplativa, com recorrentes imagens de água límpida, corrente, além do mar (uma obsessão do diretor).

Há algo de teatral em Cleópatra, há um silêncio absoluto que, entrecortado de falas refinadas até o extremo, e que, por não existir na maioria dos filmes, nos espanta e inquieta: na maioria dos filmes, observem, há ruído ou música incidental o tempo todo. Em Bressane não; aqui se vai ouvir belos diálogos, contemplar longamente belas cenas, ouvindo o mar se arrebentando em ondas ao fundo. O início é propositalmente abrupto: sabe-se, de cara, que é um filme experimental refinado e que vai exigir muito do espectador: o recado está dado, Pompeu está morto e sua cabeça decapitada é contemplada longamente. Quase não há trilha sonora. Há um jogo entre falas e silêncio, luz e sombra, preto e branco e cores. A música, quando entra, é para ser ouvida, é personagem da trama: um lindíssimo trecho de ópera comenta a grandeza de Júlio César, um samba comenta o sofrimento da protagonista, enquanto vemos seu rosto moreno, altivo. Um belo filme, mas que exige algum entendimento de história, ao contrário dos filmes épicos norte-americanos.

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