sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Beck & Malina em Ouro Preto

Julian Beck & Judith Malina

Reproduções da reportagem publicada na revista O CRUZEIRO - junho 971


Living Theather em Minas
Texto de Fernando Brandt
Fotos de Juvenal E. Pereira


Ouro Preto assistiu, no mês passado, à exibição de um grupo teatral de vanguarda, recriado por dois americanos fundadores do Living Theather. Julian Beck e Judith Malina, após atuarem, durante vinte anos, na Europa e Estados Unidos, tentam agora mostrar aos brasileiros a razão de sua peregrinação: levar o teatro ao povo, sem formalismo, num convívio direto, aplicando o seu binômio: vida e trabalho (amor e teatro) e a fila do casal (ao lado com o pai) participa da existência comunitária, em que as perspectivas artísticas conduzem a palcos como o de Saramenha



Ele sai pelas ruas com a filha Isha e faz as compras do dia. Ela – a mesma vaidade feminina – pinta o rosto, em frente à janela. O fotógrafo começa a segui-los. É importante mostrar a todos como eles vivem. Julian Beck e Judith Malina – remanescentes do Living Theather, movimento que fundaram e que, durante vinte anos, agitou e impulsionou o teatro na Europa e os estados Unidos – estão em Ouro Preto.
Seus novos companheiros de trabalho e vida: três brasileiros, um peruano, alguns americanos, europeus, australianos. Numa casa da Rua Pandiá Calógeras, a poucos metros da Estação da Central, vivem, comunitariamente, 24 horas, dedicados ao binômio que os liga e inspira – a vida (amor) e trabalho (teatro), dualidade que acaba não existindo, segundo dizem:
“O trabalho é algo que fazemos em todas as situações, enquanto comemos, dormimos, fazemos compras, viajamos ou fazemos amor.”
Além disso, se a gente se sensibiliza com o mundo e seus problemas, o trabalho torna-se, obrigatoriamente, parte da vida e os dois se confundem.
Sobre a vida em comunidade: não entendem como um grupo possa fazer um trabalho desalienante se os seus integrantes não vivem juntos , não participam de todos os problemas juntos, se o trabalho é produto de vários impulsos individuais alienados.

CONTATO POPULAR

Buscando o contato com as pessoas simples, “pois elas entendem tudo melhor”, fugindo do teatro de palco, público e tradições burguesas, de gravata e aplausos convencionais, eles procuram a praça pública, onde está o povo, “e é com ele que queremos falar”.
Não possuem a forma de chegar, integralmente, ao coração das pessoas da rua, sem concessões, mas a procuram, a todo momento, no trabalho diário. Em Ouro Preto pretendiam fazem um espetáculo durante o Festival de Inverno, mas os organizadores não quiseram, e eles não entenderam.
O CRUZEIRO esteve com o grupo em sua primeira apresentação em Minas Gerais. Um ritual de incrível beleza, de plasticidade e libertação, com a colaboração dos meninos do grupo escolar de Saramenha. No centro do imenso salão, dividido em seis partes, o teatro começa, cifrão, casa, relógio e coração são os símbolos e vão sendo percorridos e vencidos por 80 garotos, de 12 a 14 anos, e pelos 13 integrantes do Living Theather. Representavam os sonhos sobre a mãe. O espetáculo era em sua homenagem.
Os movimentos coletivos, a criação em conjunto, tornaram-se um jogo, belo e puro de que todos queriam participar. No final, derrotada a Big Mother, o encontro do amor e o desejo de respirar (adquirir força), viver, e a vontade de voar, voar, voar, como gritavam todos, e destruir os laços, os preconceitos. Lá fora, depois de tudo, os símbolos voltaram a se materializar.

PERSPECTIVAS
Agora, caminhando pela estrada, de volta a Ouro Preto, pedem carona e conseguem. Vão conversando com a gente simples, como gente simples. Os cabelos, as roupas, a língua estranha (de alguns, pois muitos já falam o português) não assustam ninguém. Estão à vontade.
Em casa irão discutir os resultados, as condições e perspectivas do trabalho. E, de manhã, estarão novamente circulando pelas ruas da cidade, mas não por muito tempo, pois suas horas se dividem entre o lar e um quarto no fundo do restaurante Calabouço, onde também trabalham. Como não poderão se apresentar no Festival de Inverno, fica-se esperando notícias de suas atividades futuras, olhando para eles, torcendo por eles...

1 comentários:

Um comentário:

Anônimo disse...

Tenho o livro "O Diario de Judith Malina", enviado por ela mesma para minha esposa, que na época da prisão dos integrantes do grupo, ela deixou sua filha de mais ou menos 7 anos na casa do meu sogro em companhia da filha que na época tinha 9 anos.