segunda-feira, 25 de agosto de 2008

Blognovela Penetrália: Capítulo 4

Capítulo 4: ANGELS IN AMERICA REZANDO CONTRA A CRUZ DO CRUZ & SOUSA

(Os bonecos dos sarapatetas e mais alguns participantes da blognovela flutuam em meio à lama. A Cruz do Cruz e Sousa parece muito à vontade naquela sala, na verdade o escritório de Lúcio, que tornou-se agora um mar de lama).

Lúcio (agora nadando, ao invés de sapatear, consegue acionar o boneco do Érico, que diz, com voz estranhamente mecânica): Você comprime seu abdômen contra a borda da mesa de escritório. Aspira o ar insalubre que nada lhe diz, graças à proteção de sua sinusite. Ajeita os óculos sobre as orelhas, as lentes refletindo o tumulto de pontos luminosos no enxame digital. Uma tomada liga sua espinha à caixa de abelhas do microcomputador: o choque, como uma chibatada seguida de um golpe de água fria, indica-lhe que o expediente se inicia.

(Fazendo o que o boneco lhe diz, Lúcio consegue abrir um ralo por onde sai a maior parte da lama).

Lúcio (sentado, segurando os pés, com a roupa suja): a solução para a Cruz do Cruz e Sousa é só uma: Elvis. E coloca uma gravação do roqueiro e crítico Sergei Chiodi: Os críticos nunca estiveram ao lado de Elvis Presley. Essa afirmação jogada assim ao vácuo das indagações pode parecer sem propósito. Será? Talvez o grande problema Elvis x críticos seja simplesmente o fato de que ele nunca se prendeu a um estilo: gravava os blues, da sua maneira sui generis, que ele tanto amava, os countries que o remetiam ao universo fosforescente dos festivais itinerantes de música do Tennessee e as baladonas pop de qualquer época que ouvia quando era criança. Tudo isso mostra que o afamado Rei do Rock era antes de tudo Rei do Pop. Sim, Rei do Pop porque sempre houve lugar na sua personalidade de grande intérprete e produtor (Sim! ele produzia seus discos) para todos os estilos de música, do gospel ao blues, do country a baladas de qualquer lugar do mundo.

Nos anos 50, Elvis não podia ter o apoio da crítica musical porque quem escrevia sobre música, na época, eram pessoas que tinham como referências musicais Nat “King” Cole, Sinatra e Bing Crosby; ou seja, pessoas que não podiam entender o porquê de um garoto branco de 19 anos, ainda por cima sulista, cantar blues. Sendo assim, os críticos não poderiam avaliar o trabalho de Presley como grande estilizador do blues urbano e do country, ou seja, o criador do que se convencionou chamar de rockabilly: ouça That’s All Right de 1954 (Toca-se a música bastante alta).

A Cruz do Cruz & Sousa: Ah, a vida antes da indústria cultural, antes de Adriana Calcanhoto e Arnaldo Antunes. Antes da revolução, como disse Talleyrand, a vida era doce. A vida antes de Elvis, como disse Francis...

Lúcio (volta a sapatear, mas põe os dedos em cruz): reacionário! Saudosista! Que bobagem é essa de antes da indústria cultural! A indústria cultural começou na Idade Média, quando surgiu a primeira ópera. Isso é uma desculpa sua, uma besteira. VADE RETRO, RETRÓGRADO!

A Cruz do Cruz & Sousa: Tudo bem, se você não me quer aqui, eu também não suporto essa sua mania chata de sapatear, tá bem? Sou poeta, editor dos maiores do Ocidente. Só não aceito que você fale da masculinidade do Hemingway. Aí é palhaçada e eu saio no braço, entendeu? Sou destemido e polêmico como Marcelo Mirisola e...

John Hemingway: Yes, he wrote a very long rebuttal of Calligaris' article, but I doubt that he has actually read my book, Strange Tribe, nor is he aware of the academic research that in the last 20 years (since the publication of the "garden of eden") has revolutionized academia's vision of my grandfather. Mind you, these are not people who "hate" Ernest or who wish in some way to denigrate him, quite the contrary. They consider him an extraordinarily complex and modern writer. Even the feminist scholars have changed their tune and now see Hemingway as a writer who was very much interested in women and in their realistic characterization. As I've said before, anyone who wishes to understand Ernest Hemingway and his writing has to be aware of his "other side."

Lúcio: John, I have this article contesting Calligaris on my blog: I guess it´s an example of a negative reaction of a young Hemingway´s fan. The title can be translated as something agressive: "The logic of the faggot catched on the dead-end". I don´t agree, it´s only a curiosity.

(A Cruz do Cruz e Sousa ergue-se e desaparece, levada por um dos anjos de Angels in America. Lúcio faz o nome-do-pai e retira uma caixa falante do boneco do Marcos Xavier, arrebentando a barriga do boneco todo sujo de lama. A caixa começa a falar sem parar, narrando um conto): Boa noite, meu nome é Talk Box. Por onde deseja começar? Neste conjunto de teclas que você vê em meu corpo, selecione o assunto desejado, pressionando a tecla correspondente. Pode me tocar, não seja tímido!

(Lúcio passou os olhos timidamente pelo corpo de Talk Box e, meio trêmulo, pressionou a tecla "História do Teatro", ao que a sofisticada máquina prontamente se manifestou):

Talk Box do Marcos Xavier-- Você escolheu um assunto muito interessante!

Lúcio-- Aposto que você diz isso para todos, pensou Malone.

Talk Box do Marcos Xavier-- Descreva-me, agora, qual a imagem que lhe vem à mente, a princípio, do teatro na antiga Grécia - murmurou, sedutora, Talk Box, silenciando-se por um minuto, para que ele pudesse falar.

Lúcio-- Bem, imagino-me no topo de um grande teatro de pedra. Ao fundo, um impressionante cenário natural. No palco, vejo uma encenação de Antígona, de Sófocles...

(Sem hesitar um segundo, tomado por uma ira incontrolável, Lúcio sacou de seu revólver calibre 38 e disparou cinco tiros contra a vagabunda...)

Uma série de pequenas explosões e faíscas iluminaram todo o escritório, enquanto frases desconexas começaram a ser emitidas desordenadamente pela Talk Box do Marcos Xavier, tais como "O Sendero Luminoso, de inspiração maoísta ... (cleng!) ... O Uruguai foi o vencedor da 1a. Copa do Mundo ... (cleng!) ... Boa noite, meu nome é Talk Box DO MARCOS XAVIER... (cleng!) ... Baudelaire criou uma nova técnica poética ... (cleng!) ... Pode me tocar, não seja tímido! ... (cleng!)". Aos poucos, entretanto, suas luzes foram-se apagando, ao passo que um denso óleo começou a escorrer de suas entranhas...

Fantasma do Pai de Hamlet: (aliviado pela saída do mar de lama): Um nariz de palhaço é muito mais do que apenas um nariz ou uma forma de esconder/revelar algo do/ao mundo. Este blog será minha tentativa de mostrar por que ser palhaço é uma forma de encarar definitivamente a liberdade de SER para os outr... puxa, pessoal.

descubro que deixo saudades.

será?

fico meio pasmo, sabem.

é como são as coisas, hoje.

ou apenas deixo uma espécie de vazio?

como um buraco negro?

não sei.

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